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O clima é outro e o Brasil pode fazer a cena

7 dez 2011 - 19h14
(atualizado às 19h40)
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Ricardo Young

Quem viveu as expectativas de um acordo que substituísse o Protocolo de Kyoto, às vésperas da COP-15, em 2009, sabe que o clima não é o mesmo desta vez. Naquele ano, abaixo-assinados e manifestações demonstraram a preocupação das pessoas de todo o mundo com a mudança climática já 10 meses antes da Conferência das Partes sobre o Clima. Não que neste ano tenha faltado plateia. A cena mudou porque os atores trocaram seus papeis.

Em Durban, África do Sul, a COP-17 começou na semana passada sem nenhum fio da esperança que a sociedade civil depositara há dois anos por um novo acordo climático, apesar de a urgência ser gritante, visto que Kyoto expira no ano que vem e não há indícios de que ele será melhorado ou prorrogado. E o pior: a previsão de ficarmos sem nenhum acordo climático é mais realista do que a de chegarmos a um novo documento.

A falta de expectativas sobre Durban não poderia refletir apenas a decepção pública com a COP-15, de Copenhague. A dificuldade de se avançar nos debates deve-se muito mais aos personagens, que não cabem mais nos papeis previstos por Kyoto.

Antes tínhamos os países ricos no papel de culpados pelas altas emissões de carbono, enquanto os pobres eram apenas vítimas do processo. O que temos hoje é uma profunda crise econômica que não dá pistas do futuro para a zona do euro. Os grandes poluidores que resistiam a Kyoto hoje são vítimas de seu próprio sistema econômico. Podem fazer muito pouco por um novo acordo climático.

Do outro lado da história, Brasil, África do Sul, Índia e China se destacam economicamente. O Brasil mostra que pode ajudar o FMI, quem diria!, e a China há quatro anos já emite mais carbono que os Estados Unidos - sim, aquele que não queria comprometer suas chaminés. Ficou para trás.

Apelidado de BASIC, esse grupo de países em vigoroso desenvolvimento caminha para ultrapassar os desenvolvidos em quantidade de emissões de carbono. E como o potencial econômico também leva responsabilidade para o cenário internacional, o G-20 vem substituindo o G-8 na governança global. Os BASIC continuam integrando o G-77 e conhecem bem o lado dos países que cobram assistência: não conseguem crescer, não têm como investir.

Compartilham responsabilidade nos dois blocos. São os únicos que se beneficiam do crescimento econômico. E ainda têm condições de reverter suas emissões, adotando políticas industriais mais limpas. É diante desse cenário que os países do BASIC não podem se omitir da liderança no processo da negociação climática.

Entre os potenciais líderes, o Brasil se destaca ainda por apresentar a melhor correlação do planeta entre recursos naturais e emissões de carbono - além de ser o anfitrião da próxima Conferência da ONU sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20. Temos abundância em recursos naturais cada vez mais preciosos ao mundo: água potável e florestas conservadas.

Esse capital natural torna a liderança do Brasil inequívoca. Entretanto, a dádiva natural exige gestão cautelosa e o retrocesso do Código Florestal é ameaça certa à autoridade brasileira nas negociações do clima. Em Durban, manifestações de ONGS internacionais contra as mudanças do Código Florestal brasileiro ficaram marcadas na primeira semana de COP. O fato e sua repercussão não deixam dúvidas de que resolver as incoerências internas será um item fundamental para que o protagonismo brasileiro se consolide.

O novo sistema econômico já se configura, exigindo qualificações ambientais e baixa emissão de carbono. Ao emergirmos como potência para o cenário global, precisamos obedecer a essa nova lógica. Afinal, todos fiscalizam um personagem central. Daí fazer a cena não pode ser confundido com "fazer cena".

Honrar o compromisso assumido em público quanto ao Código Florestal e garantir uma gestão democrática tornando transparentes os processos do polêmico projeto da hidrelétrica de Belo Monte, por exemplo, são alguns aspectos com que o governo brasileiro deve se preocupar no período que separa Durban da Rio+20.

Mas, por ora, a oportunidade faz o líder e o anfitrião da Rio+20 tem todas as credenciais para liderar a negociação da COP-17, mediar interesses e convidar os líderes mundiais a um diálogo eficaz no próximo junho. A configuração geopolítica já lhe dá o papel de protagonista. Só falta entrar em cena.

Fonte: DiárioNet DiárioNet
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